O Observatório Notícias e Análises, página da organização Observatório de Favelas, levantou esse debate junto às organizações que vêm discutindo o tema regulamentação da mídia. Além de ouvir a opinião de figuras ligadas ao movimento pela democratização da comunicação, o Observatório fez questão também de apresentar a opinião da organização patronal Agência Nacional de Jornais (ANJ).
O novo ministro das Comunicações do governo da presidente Dilma Roussef, Paulo Bernardo, no discurso de transmissão de cargo, defendeu a necessidade de um novo marco regulatório para o setor. De acordo com matéria veiculada no Portal Terra, o novo ministro disse que não se trata de uma revisão de direitos de liberdade de expressão já conquistados, e sim da garantia da pluralidade da informação.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, novamente defendeu uma agência de regulação da mídia, dizendo que "todos os países desenvolvidos do mundo têm uma agência. E ninguém vai lá xeretar o que você vai falar. Depois que você falou, se fez alguma propaganda incitando a pedofilia ou o racismo, por exemplo, ela olha aquilo e toma providências. Faz uma advertência para o difusor, e é isso". Ainda sobre o tema, Bernardo disse ao jornal O Globo que a discussão deve ser feita "da forma mais pública possível, com audiências públicas e grandes debates".
No entanto, no último final de semana, em entrevista a diversos jornais, o ministro Paulo Bernardo recuou em relação ao que havia dito anteriormente, e disse que há outras prioridades em relação ao marco regulatório, como o projeto de banda larga. Sobre o marco, Bernardo afirmou que é preciso um "exame detalhado" do projeto.
O Observatório Notícias e Análises levantou esse debate junto às organizações que vêm discutindo o tema.
Celso Schroder [1]
"Todas as democracias consolidadas têm instituições reguladoras da mídia, que regulam a implementação de políticas públicas no campo da comunicação. O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) defende a necessidade de um controle público para o exercício da liberdade de expressão e para a aplicação de regras democráticas através de mecanismos públicos. Entre as formas de controle estão os conselhos, que quanto maiores, mais representativos e transversais, melhor. É por isso que é importante a existência de conselhos como esse, que seja mais executivo e deliberativo, como foi discutido na Conferência Nacional de Comunicação (Confecom).
A garantia da liberdade de imprensa tem que se dar de acordo com os interesses da população e não de interesses comerciais e privados
As falas do ministro Paulo Bernardo não têm sido claras quando ele aponta alguns tipo s de regulações. Ao que aprece, ele não está reconhecendo a Confecom e as suas decisões. Ele sinaliza para uma nova consulta, e isso é muito ruim, porque foi um enorme esforço que precisa ser contemplado.
A garantia da liberdade de imprensa tem que se dar de acordo com os interesses da população e não de interesses comerciais e privados. Quando dizem que um órgão regulador pode acarretar uma censura, isso é uma crítica ingênua e desprovida de qualquer argumento político. Ao contrário, nesse atual momento do sistema de comunicação no Brasil, a gente não consegue discutir o papel da mídia em relação à mulher, ao negro, aos homessexuais, porque as discussões hoje são limitadas ao interesse comercial. Isso sim é censura, quando a população não decide o destino e o que é discutido.
O que vemos é uma tentativa exaustiva de não regulamentação, impondo ao sistema de comunicação no Brasil a voz do dono, do gerente ou do governo. O que a FENAJ e o FNDC pautam é que a comunicação, assim como a saúde e a educação, é um serviço público, que deve ter um controle público – e não estatal".
Alberto Dines [2]
"Primeiro é preciso cumprir a Constituição ou então revogá-la. E ao cumprir a Carta teremos que ressuscitar o Conselho de Comunicação Social. Entrementes inicia-se o debate sobre o marco regulatório, isonomia para a distribuição de conteúdos, participação estrangeira, etc., etc.
A agência é a última etapa. Penso que então podemos pensar em algo parecido com a americana FCC, criada em 1934. Antes disso, o Ministério das Comunicações, o Conselho e as comissões da Câmara e do Senado podem encarregar-se de limpar o terreno e colocar a mídia eletrônica dentro da legalidade".
Ricardo Pedreira [3]
"Mais do que desnecessária esse tipo de instância reguladora é incompatível com a liberdade de expressão. Um conselho ou um órgão fiscalizador nos termos do que tem sido proposto pelos setores que defendem o chamado controle social da mídia implicará em interferência nos conteúdos jornalísticos, o que fere frontalmente o princípio da liberdade de expressão previsto na Constituição. O controle social já existe, nos termos da Constituição e de toda nossa legislação. Há o direito de resposta e a legislação sobre danos morais. E o Poder Judiciário para julgar questões relacionadas ao direito de resposta e à legislação sobre danos morais.
Um dos pilares da convivência democrática é o de que ninguém tem o direito de determinar aos outros o que é mais ou menos adequado para ser dito, para ser expresso. Numa democracia, todo mundo é absolutamente livre para expressar aquilo que quer, sem nenhuma limitação prévia. Isso não significa impunidade, pois nos casos de mentira ou calúnia, sempre haverá a possibilidade da punição posterior. Um órgão regulador da mídia pode acarretar em censura porque agirá necessariamente de acordo do que pensam os seus integrantes, com as convicções e a ideologia de seus integrantes. Eles terão o poder de julgar que tal ou qual informação ou opinião é mais ou menos adequada. Para evitar esse dirigismo é que existe a plenaliberdade de expressão, sem nenhum controle prévio, mas com eventuais penalidades posteriores, por meio do direito de resposta ou da legislação sobre danos morais".
[1] Celso Schroder é presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e membro do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC
[2] Alberto Dines é o Editor responsável pelo Observatório da Imprensa
[3] Ricardo Pedreira é diretor executivo da Agência Nacional de Jornais (ANJ)
Da redação, com Observatório de Notícias e Análises
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